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Novo Artigo sobre o Acidente de Brumadinho

O Acidente de Brumadinho: Algumas Reflexões Adicionais

Luiz Fernando Seixas de Oliveira

Presidente da ABRISCO

Maior Acidente Industrial do Brasil e Segundo Maior do Mundo com Barragens de Rejeitos

Desde o dia deste acidente realmente catastrófico (25/01/19), tenho pensado incessantemente sobre os fatores que levaram à ocorrência de um acidente desta magnitude em uma companhia da importância e do prestígio internacionalmente da Vale. E este pensamento ficou ainda mais encravado na minha mente, depois de ver as cenas verdadeiramente impressionantes e dramáticas do desmoronamento quase que instantâneo de toda aquela massa de lama, bem como a sua rápida movimentação pelo vale a jusante da barragem, varrendo implacavelmente tudo o que estava no seu caminho. A dezessete dias do rompimento da barragem, a contagem das vítimas chega a 165 mortes confirmadas e 160 desaparecidos, indicando que ao final, o número de vítimas fatais ficará acima de 300. Isto coloca este acidente no desonroso posto de segundo maior acidente (em número de mortes) com barragem de rejeitos no mundo em todos os tempos, atrás apenas do acidente de Mir em Sgorigrad, Bulgaria em 1966 (488 fatalidades). E ainda mais, eleva-o ao primeiro lugar como o maior acidente industrial de todos os tempos no Brasil.

Sobre as Causas do Acidente

Que fatores levaram à ocorrência deste acidente? Ainda é cedo para se poder responder essa pergunta com um grau de confiança razoável, pois trata-se de um evento complexo, que, tal como costuma suceder na maioria dos grandes acidentes industriais, raramente decorre de uma única causa. Certamente, este também terá mais de uma causa básica, possivelmente uma cadeia de alguns eventos, possivelmente em diferentes períodos e momentos que se concatenaram para produzir esta tragédia. Ao que tudo indica, observando-se o vídeo do colapso da barragem e pela opinião de alguns especialistas, aconteceu o fenômeno da liquefação estática da lama na barragem, mas o que causou tal fenômeno, ainda será objeto de várias investigações.

Na maior parte das vezes, as causas de grandes acidentes deste tipo envolvem uma combinação de eventos físicos (falhas estruturais, falhas de equipamentos), falhas humanas (erros humanos, violações) e falhas organizacionais ou gerenciais. Incluem-se aqui também as possíveis deficiências na supervisão da segurança da barragem, tanto interna, da parte da própria companhia operadora, como externa, da parte dos órgãos e entidades responsáveis pela supervisão externa da segurança operacional da barragem.

Em análise de risco, costuma-se dividir o acidente em duas fases distintas: aquela anterior à ocorrência do evento acidental e a que vem em seguida a este evento. A primeira fase é dominada pelas causas básicas do evento acidental, que no presente caso, foi a própria ruptura da barragem (pelas imagens, tem-se mais a impressão de um desmantelamento súbito de toda a barragem, aparentemente causado pela liquefação da lama). Na segunda, predominam os fatores causais que levaram aos desfechos do acidente, ou seja, às suas consequências, no presente caso, as mortes de mais de 300 pessoas, entre funcionários da Vale e membros das comunidades situadas ao longo do caminho percorrido pela lama. Essas duas partes tendem a ser independentes uma da outra (há casos em que não o são), ou seja, poderia ter acontecido o total desmantelamento da barragem sem que isso levasse ao chocante número de mortes do acidente. Dessa forma, cabe investigar não apenas as causas do desmoronamento, mas também porque as consequências do acidente foram tão absurdamente altas.

A Investigação do Acidente

De um modo geral, é raro que uma estrutura como uma barragem de grande porte desmorone quase instantaneamente sem dar sinais prévios de degradação de um ou mais dos seus elementos estruturais. Esta condição foi reconhecida pelo Presidente da Vale em uma entrevista com jornalistas, porém, de acordo com suas palavras, isso não teria acontecido no acidente de Brumadinho. Segundo ele, algo realmente novo, algum fenômeno possivelmente ainda desconhecido no universo operacional das barragens de rejeitos, deve ter acontecido em Brumadinho. Em princípio, temos que receber esse tipo de argumento com ceticismo, já que projeto e construção de barragens têm pelo menos uns cento e cinquenta anos de engenharia. Segundo o próprio site da Vale (http://www.itv.org/linha-de-pesquisa/tecnologia-de-barragens-e-disposicao-de-rejeitos/):

“Os primeiros estudos sobre do projeto de barragens e performance de suas estruturas começaram em 1850, com o engenheiro civil William John Macquorn Rankine, da Universidade de Glasgow. Desde então, as técnicas evoluíram, mas alguns princípios básicos continuam válidos. Atualmente, existem no mundo pouco mais de 56 mil barragens. A maior concentração está na China (23.842), depois vêm os Estados Unidos (9.260), Índia (5.100), Japão (3.112) e Brasil, que conta com mais de 1.400 barragens.”

É possível que, mesmo após tanta experiência com a engenharia de barragens (projeto, construção, operação, manutenção e descomissionamento), um fenômeno totalmente novo, até então inteiramente desconhecido, possa ter acontecido em Brumadinho, ou seja, um “black swan”*, como se costuma dizer no jargão atual de gerenciamento de risco (ver nota ao final). Mas, no mínimo, essa afirmativa tem que ser inicialmente encarada com uma alta dose do bom ceticismo científico. Se isso ficar cabalmente demonstrado na investigação do acidente de Brumadinho, então teremos ao menos incorporado um novo conhecimento que será bastante útil para a prevenção da ocorrência de mais “black swans” em outras barragens (mais provavelmente em barragens de água e não de lama).

(continua na aba Área do Associado - Artigos)

Na continuação do artigo, são tratadas questões relacionadas à análise contida na dissertação de mestrado e à comissão independente de investigação do acidente anunciada pela Vale. Mas para aprecia-lo na sua totalidade, é preciso que seja associado da ABRISCO para poder ter acesso à Área do Associado neste site. Se ainda não o é, pode fazê-lo agora mesmo, usando o procedimento super simples na aba "Associe-se". A anuidade custa apenas R$150,00. Contamos com a sua participação. Obrigado.

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Luiz Fernando Seixas de Oliveira

Especialista em risco e confiabilidade com 40 anos de experiência no Brasil e no exterior, tendo sido pioneiro na aplicação de análise de risco e confiabilidade no Brasil.

PhD em Engenharia Nuclear pela U.C. Berkeley, em 1979. Foi por 13 anos professor da COPPE/UFRJ. Trabalhou por dois anos no Laboratório Nacional de Brookhaven nos EUA. Fundou a PRINCIPIA Engenharia, a qual foi adqui­rida em 2000 pela DNV GL.

É Vice-Presidente da DNV GL, e atualmente Gerente do Centro de P&D da DNV GL no Rio de Janeiro. É autor de mais de 120 trabalhos técnicos publicados em revistas e conferências. É Presidente da ABRISCO.

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